domingo, 16 de outubro de 2016

BRAVO, COMO SEMPRE BRILHANTE.




Como já escrevi sete romances, o que gostaria era de ter um filho. Até digo mais, sabendo hoje o que sei, trocava os meus sete romances por um filho. Quem não tem romance e tem filho tem a obrigação de ser mais feliz que eu.
Não é efectivamente possível imaginar que um autor possa contentar-se com o que fez. Pode estar apaziguado com o livro, mas satisfeito não. Aí é um autor morto.
Talvez tenha que ver com a minha avidez pela poesia, um género que não se conforma com repetições ou parecenças, antes exige universos muito definidos, únicos e irrepetíveis.
É  de tal maneira cruel que muitos dos bons autores são lembrados por um ou dois poemas. Ninguém quer saber da obra completa porque ele supera-se numa só linha, daí que essa escola me traga necessidade de superação. Não concebo escritores de livros de pura narração sem precisarem de emanações irregulares e insuperáveis.
As montanhas são tendencialmente selvagens, e lugares sem deturpação humana são lugares elevados, há uma sacralização da elevação como algo a que o homem não tem o direito porque é verdadeiramente território dos deuses, onde só o esplendor da liberdade da natureza se impõe.
- Recordo a praga que Saramago lhe lançou ao dizer que o seu livro era um " tsunami literário ", ou seja, a precisar de réplicas?
- É o melhor dos elogios, mas é também um pontapé no rabo porque impõe uma responsabilidade. Tenho uma fotografia muito bonita com o Saramago, onde estou de olhos fechados e ele tem o seu dedo esticado a tocar-me no peito, como se indicasse o coração. Lembro-me do que dizia quando nos fizeram essa fotografia : " nunca obedeças ao que te vão pedir e nunca sejas igual, segue sempre a tua pulsão. " ....



Valter Hugo Mãe
em Diário de Notícias

Um comentário:

Anônimo disse...

Por lapso, estava convencido de já ter feito este comentário! Uma grande e boa entrevista, que a tinha lido na altura da publicação no jornal; esta citação é fechada com "chave de ouro", com uma referência ao incontornável e saudoso José Saramago...

Aníbal